"Ninguém o pode aconselhar ou ajudar - ninguém. Não há senão um caminho. Procure entrar em si mesmo. Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos recantos mais profundos de sua alma.(...) Procure soerguer as sensações submersas desse longíquo passado: sua personalidade há de reforçar-se, sua solidão há de alargar-se e transformar-se numa habitação entre lusco e fusco diante da qual o ruído dos outros passa longe, sem nela penetrar.(...) Aceite seu destino e carregue-o com seu peso e sua grandeza, sem nunca se preocupar com recompensa que possa vir de fora. O criador, com efeito deve ser um mundo para si mesmo e encontrar tudo em si e nessa natureza a que se aliou." Cartas a um jovem poeta - Rainer Maria Rilke
Aconteceu. Eu nunca poderia imaginar que de uma hora pra outra isso aconteceria. Sim, ele estava dando pequenos sinais de fraqueza, lentidão. Eu reclamava, desistia, mas não prestei a menor atenção ao que isso podia significar. Meu computador morreu. O HD pifou. Perdi todos os meus documentos e um monte de coisas com muita e nenhuma importância. Tudo foi embora, muitos e muitos rastros de mim. Todas as fotos dos meus trabalhos se foram, todos os registros do que eu fui capaz de criar, sumiram.
Isso me pareceu a cereja do bolo no contexto da minha vida, atualmente. E surpreendentemente, eu peguei a cerejinha e mastiguei bem devagar. Parei tudo. Sentei e chorei. Respirei. Levantei, tomei banho, me arrumei e fui pruma reunião de trabalho sem material algum. Saí de lá e fui pra assistência técnica onde foi constatado o dano desastroso. Deixei o computador, voltei pra casa e observei um tempão o espaço que ele ocupava na mesa.
Por que escrevo sobre isso?
Esse episódio do computador foi só a versão literal e concreta do meu processo atual. Não importa o quão poderoso, eficiente algo ou alguém seja. Sempre é preciso atenção. Atenção e não controle, porque tudo está sujeito a "pifar" de uma hora pra outra.
Tenho tido muito foco, mas pouca atenção, a ponto de perder o entorno. Como uma cabra persistente subindo a montanha com a cabeça enfiada no peito, olhando o chão. Outras vezes sou como um cavalo galopando em campo aberto, sem atentar aos detalhes e sem muitos limites. Na maioria, um touro sangrando e mesmo assim batendo cabeça numa tourada até seu derradeiro fim.
Depois que retomei o prumo, fiquei com inveja da máquina, talvez ela não tenha pifado. Talvez ela tenha dado um salto para outra consciência! (rio até chorar com essa colocação maluca). Queria que meu HD tivesse pifado de vez pra colocar outro no lugar! Sem controle algum, tudo apagado, sem rastros! Que sensação de liberdade!
Ver meu computador funcionar de novo com sistema operacional e programas mais modernos, parece mais uma loucura mas me fez sorrir. Será que pode ser assim comigo também pane após pane? Ficar vazia de tudo, cheia de espaço no HD?
Conversei comigo mesma na cama a noite toda, triste e sem sono. Acordei e um dia surpreendente aconteceu, novas alternativas e constatações. Uma delas é que quanto mais maduro estamos, mais aceitamos ser desafiados pela vida. Quanto mais nos entregamos a imaturidade, mais precisamos de explicações. Outra é que preciso atentar aos limites mais uma vez. Limite das minhas fraquezas e poderes. Limite do que posso oferecer e quero receber. Chega de querer acertar as respostas sempre, chega de querer passar mensagens corretas. Limites pra mim, limites para o outro. Até onde vai, onde pára e onde não há realmente limites. Parece paradoxal a idéia de liberdade, mas talvez contemplar e respeitar limites, nos dê um pouco mais de autonomia e nos torne hábeis para uma verdadeira liberdade.
Quando achei que tudo tava em certa ordem e controle, perdi o chão. Quando achei que tava perdida, tava tudo certo. É bom não ter nada de vez em quando. É bom aprender a perder e reconhecer quando estamos por baixo. E é muito bom, ter um punhado de gente boa por perto nessas horas extremamente solitárias de perdas e dúvidas. E é gratificante saber ser sozinha mesmo com muita gente ao redor.
Pra quem quiser ir mais a fundo no tema, assista "Piaf". Lindo filme, linda história. Edith Piaf viveu perda após perda na carne e mesmo assim manteve um olhar lindo de menina e com seu corpo franzino e frágil expôs em forma de arte todo o amor e intensidade que tinha dentro do peito. Transmutação em forma de canto. E não é assim com os grandes artistas?
"Non, rien de rien (Não, absolutamente nada)
Non, je ne regrette rien (Não, eu não lamento nada)
Ni le bien qu'on m'a fait (Nem o bem que me fizeram)
Ni le mal (Nem o mal)
Tout ça m'est bien égal (Isso tudo me é indiferente)
Avec mes souvenirs (Com minhas lembranças)
J'ai allumé le feu (Acendi o fogo)
Mes chagrins, me plaisirs (Minhas mágoas, meus prazeres)
Je n'ai plus besoin d'eux (Não preciso mais deles)
Balayés les amours (Varridos meus amores)
Avec leur trémolo (Com todos os seus tremores)
Balayés pour toujours (Varridos para sempre)
Je repars `a zéro (Vou recomeçar do zero)"
P.S: Dedicado ao Herbert, Massao, Erica e Mirene.
Aconteceu. Eu nunca poderia imaginar que de uma hora pra outra isso aconteceria. Sim, ele estava dando pequenos sinais de fraqueza, lentidão. Eu reclamava, desistia, mas não prestei a menor atenção ao que isso podia significar. Meu computador morreu. O HD pifou. Perdi todos os meus documentos e um monte de coisas com muita e nenhuma importância. Tudo foi embora, muitos e muitos rastros de mim. Todas as fotos dos meus trabalhos se foram, todos os registros do que eu fui capaz de criar, sumiram.
Isso me pareceu a cereja do bolo no contexto da minha vida, atualmente. E surpreendentemente, eu peguei a cerejinha e mastiguei bem devagar. Parei tudo. Sentei e chorei. Respirei. Levantei, tomei banho, me arrumei e fui pruma reunião de trabalho sem material algum. Saí de lá e fui pra assistência técnica onde foi constatado o dano desastroso. Deixei o computador, voltei pra casa e observei um tempão o espaço que ele ocupava na mesa.
Por que escrevo sobre isso?
Esse episódio do computador foi só a versão literal e concreta do meu processo atual. Não importa o quão poderoso, eficiente algo ou alguém seja. Sempre é preciso atenção. Atenção e não controle, porque tudo está sujeito a "pifar" de uma hora pra outra.
Tenho tido muito foco, mas pouca atenção, a ponto de perder o entorno. Como uma cabra persistente subindo a montanha com a cabeça enfiada no peito, olhando o chão. Outras vezes sou como um cavalo galopando em campo aberto, sem atentar aos detalhes e sem muitos limites. Na maioria, um touro sangrando e mesmo assim batendo cabeça numa tourada até seu derradeiro fim.
Depois que retomei o prumo, fiquei com inveja da máquina, talvez ela não tenha pifado. Talvez ela tenha dado um salto para outra consciência! (rio até chorar com essa colocação maluca). Queria que meu HD tivesse pifado de vez pra colocar outro no lugar! Sem controle algum, tudo apagado, sem rastros! Que sensação de liberdade!
Ver meu computador funcionar de novo com sistema operacional e programas mais modernos, parece mais uma loucura mas me fez sorrir. Será que pode ser assim comigo também pane após pane? Ficar vazia de tudo, cheia de espaço no HD?
Conversei comigo mesma na cama a noite toda, triste e sem sono. Acordei e um dia surpreendente aconteceu, novas alternativas e constatações. Uma delas é que quanto mais maduro estamos, mais aceitamos ser desafiados pela vida. Quanto mais nos entregamos a imaturidade, mais precisamos de explicações. Outra é que preciso atentar aos limites mais uma vez. Limite das minhas fraquezas e poderes. Limite do que posso oferecer e quero receber. Chega de querer acertar as respostas sempre, chega de querer passar mensagens corretas. Limites pra mim, limites para o outro. Até onde vai, onde pára e onde não há realmente limites. Parece paradoxal a idéia de liberdade, mas talvez contemplar e respeitar limites, nos dê um pouco mais de autonomia e nos torne hábeis para uma verdadeira liberdade.
Quando achei que tudo tava em certa ordem e controle, perdi o chão. Quando achei que tava perdida, tava tudo certo. É bom não ter nada de vez em quando. É bom aprender a perder e reconhecer quando estamos por baixo. E é muito bom, ter um punhado de gente boa por perto nessas horas extremamente solitárias de perdas e dúvidas. E é gratificante saber ser sozinha mesmo com muita gente ao redor.
Pra quem quiser ir mais a fundo no tema, assista "Piaf". Lindo filme, linda história. Edith Piaf viveu perda após perda na carne e mesmo assim manteve um olhar lindo de menina e com seu corpo franzino e frágil expôs em forma de arte todo o amor e intensidade que tinha dentro do peito. Transmutação em forma de canto. E não é assim com os grandes artistas?
"Non, rien de rien (Não, absolutamente nada)
Non, je ne regrette rien (Não, eu não lamento nada)
Ni le bien qu'on m'a fait (Nem o bem que me fizeram)
Ni le mal (Nem o mal)
Tout ça m'est bien égal (Isso tudo me é indiferente)
Avec mes souvenirs (Com minhas lembranças)
J'ai allumé le feu (Acendi o fogo)
Mes chagrins, me plaisirs (Minhas mágoas, meus prazeres)
Je n'ai plus besoin d'eux (Não preciso mais deles)
Balayés les amours (Varridos meus amores)
Avec leur trémolo (Com todos os seus tremores)
Balayés pour toujours (Varridos para sempre)
Je repars `a zéro (Vou recomeçar do zero)"
P.S: Dedicado ao Herbert, Massao, Erica e Mirene.