segunda-feira, 19 de abril de 2010

Alessandra nas paisagens


"O coelho pergunta a lagarta azul: Essa é a verdadeira Alice?
E ela responde: Não completamente..."

Alice no País das Maravilhas

Alessandra tem facilidade de escrever. Alessandra é animada. Alessandra é esportista. Alessandra é muito sociável. Alessandra perdoa fácil. Alessandra é forte. Alessandra é corajosa. Alessandra é muito yang. Alessandra é uma "fofa". Alessandra é brava. Alessandra é independente. Alessandra é zen. Alessandra não se enquadra. Alessandra é empreendedora. Alessandra é fechada. Alessandra é complexa. Alessandra é hippie. Alessandra é acelerada. Alessandra é engraçada. Alessandra é extrovertida. Alessandra é profunda. Alessandra é certinha. Alessandra é patricinha. Alessandra é impulsiva. Alessandra é doce. Alessandra é melancólica. Alessandra é louca.

Esses são alguns dos meus cartões de visita, uma mistura dos rótulos que recebo e das crenças sobre mim mesma, tudo isso junto é verdade e é mentira. A vida tem se mostrado tão paradoxal que 'as vezes encontro dificuldades em distinguir um sentimento niilista de um possível lapso de lucidez, o que tem atrapalhado a Alessandra que gosta de escrever. Em momentos de maior tensão na Escala Richter, sempre fico em dúvida de como e o que expressar algo que mereça ser publicado... rs

Esse fim de semana fui estudar no CEBB e o principal tema foi lucidez no corpo, energia, mente e paisagem. O corpo e a energia obedecem a mente. A mente é um reflexo da paisagem em que nos encontramos e "paisagem" no Budismo é visão de mundo, o ponto em que estamos e de onde enxergamos as perspectivas.
Karma são os condicionamentos dessa mente, a forma automática como reagimos aos fenômenos e que pode nos colocar em diferentes paisagens em segundos. Então, para cada karma uma paisagem e de dentro de cada paisagem, um olhar, tudo isso de forma muito sutil.
Pois bem, dependendo em que paisagem você esteja assim você verá qualquer pessoa, coisa, idéia, "realidade". Essa tem sido minha principal reflexão, como tudo muda o tempo todo e eu altero passado e futuro com minha mente, onde está a lucidez que eu tanto busco? Onde é esse ponto que precisa ser transformado? Como alcançar essa paisagem mais elevada que não estremece com nenhum terremoto?
Métodos e caminhos existem vários, e graças a esses conhecimentos posso ampliar minha visão. Mas isso tem se mostrado um tanto insuficiente quando na prática nada acontece e fica só na lógica, parecendo um truque, uma "pegadinha"... Quanto mais quero alcançar algo, mais se distancia, quando mais me frustro, mais me sinto distante das pessoas, quando mais aprofundo, mais me sinto maluca, quanto mais quero acertar, aparece um dedo indicador me censurando... Então relaxo, achando que encontrei uma forma interna de lidar com tantos desafios mas mesmo assim permanece o sofrimento e aquele incômodo no estômago...
Então muitas vezes quero voltar a ser algumas velhas Alessandras e em outros eu gostaria de ser a Alessandra que imagino, como se nelas encontrasse alguma "fórmula" que tenha "dado certo". Mas me ocorre que no máximo seria um grande Frankstein de mim mesma e quando tento acessá-las acontece como num erro de senha no caixa eletrônico: "senha não confere, tente novamente."

O sofrimento acontece quando me entristeço com a vida exatamente como ela é, quando meus idealismos, crenças, valores, expectativas não servem de nada na alteração dessa realidade. Então a vida se encarrega de provocar grandes terremotos que fazem ruir as diversas identidades que habitam em mim. A vida é uma sucessão de aventuras, alegrias, prazeres, saúde. Mas a vida também é sofrimento, doença, morte, tristeza, amargor, dureza. Aonde está a beleza constante disso tudo?

Essa beleza eu encontro quando saio desses estados que oscilam e vou de encontro a alguma "paisagem" mais elevada quando curiosamente investigo, fuço, experimento a vida como ela se apresenta; quando simplesmente silencio e observo: como se  estivesse num tapete mágico, enxergo do alto, o vento novo refresca meu rosto e percebo o quão restrita é minha visão. Ou quando mesmo de dentro do desespero e da tormenta consigo esboçar um sorriso.

Ultimamente tenho reverenciado os momentos indigestos. Ao permanecer um pouco na indigestão e nó na garganta, o que é ilusório fica mais claro como construído pelo meu olhar e cada karma percebido é como um maravilhoso e dolorido lembrete da paisagem em que estou.

Com isso quero compartilhar o quão necessário é viver o sofrimento também. O quão importante para o crescimento e desenvolvimento espiritual é repousar no meio da merda. O quão importante é parar, por minutos que seja e observar sentido a agonia e o mal cheiro para poder seguir limpo. Não precisamos ir ao inferno e ficar por lá, mas ter a liberdade de poder sorrir de lá de dentro também.

Nesses momentos em que não aceitamos a realidade como ela é, em que resistimos a amadurecer e ser "gente grande" (no sentido da responsabilidade sobre os atos) entramos num mundo subterrâneo como "Alice no pais das maravilhas", onde somos postos a prova pelas sombras e diversas identidades que surgem em cada situação. Se soubermos aproveitar essa jornada, sairemos mais íntegros e autênticos para prosseguirmos no caminho, buscando a lucidez de observar paisagens e estados de espírito sem sermos arrastados por eles. Poder transitar entre as diversas configurações da vida e ainda assim manter-se vivo e com energia estável deve ser algum tipo de liberdade muito interessante e ampla, uma verdadeira aventura.

O mais importante é despertar para contribuir com o outro, com o mundo. Quanto mais circulo e exerço minha liberdade mais tenho a oferecer. Quanto mais ofereço mais paisagens positivas são criadas até o ponto em que naturalmente isso se manifesta, sem esforço. Não é papo de "budistinha", é com grande dificuldade que acesso essas paisagens mas com uma certa convicção de que quando experimento, sinto que algo realmente se transforma.
Como uma "Alice no país das maravilhas" questiono, tropeço, fico grande e pequena, acredito no impossível mas, principalmente, me alegro com os gatos risonhos, chapeleiros malucos, coelhos e lagartas que generosamente me apontam caminhos. E 'as vezes tenho um sorriso sereno de criança que brinca sabendo que é uma brincadeira e vejo "mágicas" acontecerem.

Alessandra encontra bem devagar e aos pouquinhos a felicidade quando abre seu coração para o mundo. E ainda não sabe bem como isso acontece, ela simplesmente vê em raros momentos de dentro de alguma paisagem muito além do país das maravilhas que sonhava pra ela...




P.S: Dedico a todos que têm compaixão com esse monte de Alessandras ;-)


Especial gratidão:

Lama Padma Samten por simplesmente poder estar perto e sentir o perfume do darma 
Rê, Déa, Ulisses que acompanham a odisséia bem de perto
Karin pelo nascimento que tem dado com olhares tão profundos
Myla que não desiste de me nutrir com textos belíssimos
Adan e Renato que sempre lembram de mim, mesmo eu não manifestando tanto o quanto lembro deles...
Erica que conhece meu corpo melhor do que ninguém e me indica desenhos animados como prática.
Ana por ser mãe, irmã, amiga e terapeuta tudo maravilhosamente junto
Minhas duas mães por muitas vezes sofrerem comigo as oscilações e ainda assim não desistirem de mim e aceitarem minhas desculpas esbaforidas...
Rodrigo pelos papos deliciosamente humanos
Dra Sandra e Dr. Gerson que cuidam de mim com muita paciência
Alê pela contribuição a pessoa física e jurídica e pelos belos baldes de água fria que fazem bem pra pele...
Teresa que com um oráculo lúcido foi uma bela lagarta nessa jornada 
Fabiano que acolheu e aceitou o desafio de mergulhar junto mesmo com todo histórico de teimosia da minha parte
Rose pela boa disposição, sempre
Kátia pelas portas abertas
Simba, meu pequeno guardião
Sanga do CEBB São Paulo, por estar lá